Título original: Hunger
Lançamento: 2008
País: Inglaterra
Direção: Steve McQueen
Atores: Larry Cowan, Liam Cunningham, Michael Fassbender, Stuart Graham
Duração: 90 min
Gênero: Drama
Importante cena de Hunger |
Ah se todos os primeiros filmes de diretores fossem como Hunger! A estreia de Steve McQueen no cinema (não confundir com seu xará, o famoso ator americano que morreu nos anos 80) é visceral, arrasadora e, ao mesmo tempo, sofisticada e econômica. O longa-metragem é o resultado de um trabalho de direção inspirado, inteligente e que vem arejar a forma de se falar de História e de violência no cinema. Hunger, escrito por McQueen e por Enda Walsh, aborda o tumultuado ano de 1981 na Irlanda do Norte. O filme focaliza a realidade carcerária de terroristas do grupo IRA, que lutavam para obter do governo inglês o status de presos políticos (que os diferenciariam dos outros criminosos). Para terem este e outros pedidos aceitos, os presos iniciaram uma greve de fome que causou a morte de nove homens.
Ótimos filmes, como Em nome do Pai (1993) e Domingo Sangrento (2002), já retrataram a violenta guerra pelo poder na Irlanda do Norte, que é alimentada também pela rivalidade entre católicos e protestantes. [Entenda mais sobre a situação da Irlanda na matéria especial da Folha Online.] O diretor inglês, sem se mostrar partidário ou opositor, explora em seu filme a paixão política dos radicais membros do IRA, paixão esta que os move a comportamentos extremos. Steve McQueen atua de forma metonímica, ao se apropriar de um capítulo de uma história sangrenta que, ao mesmo tempo, nos dá toda a dimensão da gravidade de um conflito que é social, político, cultural e religioso.
O filme é metonímico também em sua estrutura e montagem. McQueen abusa dos planos-detalhes e dos closes para focalizar objetos, partes do corpo de seus personagens, marcas e detalhes. A estratégia do diretor é reveladora de um olhar agudo sobre o ambiente carcerário, sobre o cotidiano dos presos e dos policiais e sobre os pequenos gestos que parecem preencher o vazio da vida na prisão. É interessante observar a forma com a qual o roteiro constrói sua narrativa, de maneira quase episódica, se interessando a personagens que são representativos de um grupo maior. Isso ocorre, por exemplo, com o policial mostrado no início da trama, um homem aparentemente normal, mas cuja rotina é invadida, a contragosto, pela violência e pelo medo. Os dois companheiros de cela focalizados, em um segundo momento, representam o grupo de jovens rebeldes, que obedecem, sem muita visão crítica, a uma liderança que está muito mais interessada na Causa do que em suas vidas. O discurso do poder dominante é representado pela voz-off de Margaret Thatcher, primeira-ministra britânica na época, que é inserida em momentos pontuais no filme.
Finalmente, o filme chega a Bobby Sands (Michael Fassbender), figura central da história. Ele representa a própria liderança do movimento terrorista. Um homem de uma ideologia inabalável, que manifesta uma auto-entrega absurda à causa pela qual luta. Para ele, a própria vida e a vida dos seus companheiros são instrumentos que devem estar à disposição de algo maior. Por mais que suas atitudes sejam questionáveis, Bobby não deixa de ser admirável pela sua perseverança. Suas motivações são exploradas de maneira brilhante em um diálogo do personagem com o Padre, filmado em um plano sequência de aproximadamente 16 minutos. Brilhantemente escrita e interpretada, a cena atípica no filme, se destaca também por quebrar o silêncio que reina durante a maior parte do longa.
Steve McQueen compreende que o cinema é, sobretudo, imagético e poderia muito bem contar essa história sem a presença de diálogos. Tudo está nas imagens e na forma com que elas se sucedem. Na brilhante sequência de abertura, por exemplo, o diretor constrói toda a natureza de um personagem, mostrando também seu conflito, sem utilizar uma fala sequer. Sóbrio, McQueen foge do supérfluo, do drama fácil e do óbvio, criando uma história chocante, sem ser sensacionalista. As cenas de violência se destacam pelo seu realismo e pela entrega física dos atores.
E por falar em entrega física, não devemos deixar de mencionar o assombroso Michael Fassbender (o astro do momento em Hollywood). O ator teve que passar por uma dieta extrema, controlada por médicos, para encarnar Bobby Sands. A transformação de Fassbender para o papel é impressionante. O ator germânico (de origem irlandesa) é uma das maiores revelações dos últimos anos e sua performance em Hunger o lançou ao estrelato. Depois deste filme, ele fez os grandes sucessos Bastardos Inglórios (2009) e X-Man: primeira classe (2011). O ator (premiado em Veneza este ano) repetirá a parceria com Steve McQueen no aguardado filme "Shame", que deve estrear ainda em 2011.
Hunger conta também com a belíssima fotografia de Sean Bobbitt. Mesmo se aproximando bastante do olhar objetivo de um documentário, o filme encontra espaço para cenas de puro lirismo, como aquela em que a imagem de Bobby se funde com a imagens de pássaros voando, já no final do longa. O filme de Steve McQueen parece indicar que uma bela carreira está começando. Seu segundo filme, Shame, já vem recebendo ótimas críticas. Estou ansioso!
Mas esse Michael Fassbender está em todas agora, e Steve McQueen parece mesmo que tem uma carreira boa pela frente. Pretendo ver esse filme amanhã, aqui no CCBB em Cartaz.
ResponderExcluirAbraços!
Pois é Gabriel, ele é o ator do momento. Este ano, além de "X-man" ele também está em "Shame" e "A dangerous method". Dizem que ele forte candidato ao Oscar ano que vem...
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