quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Clássicos da Cinemateca - A Felicidade Não Se Compra (1946)


“Lembre-se, George: nenhum homem é um fracasso quando tem amigos.
“Você quer a lua? Eu te darei a lua! Eu vou laçá-la e dar para você.”
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Célebre cena final de A Felicidade Não se Compra 
A Felicidade Não se Compra (It’s a Wonderful Life) é certamente um dos filmes mais inspiradores da Era de Ouro de Hollywood. O longa-metragem de 1946 é a adaptação de The Greatest Gift, conto do escritor americano Philip Van Doren Stern, publicado em 1943. A Felicidade Não se Compra é considerada a maior obra-prima do diretor Frank Capra, responsável por outros clássicos inesquecíveis como Aconteceu Naquela Noite (1934), O Galante Mr. Deeds (1936)Do Mundo Nada se Leva (1938)  e A Mulher Faz o Homem (1939).
Frank Capra nasceu na Itália, mas se mudou aos seis anos para os Estados Unidos com os pais. Visto como um dos diretores mais importantes da Hollywood clássica, Capra acumulou prêmios, prestígio e honrarias em mais de 40 anos de carreira. A revista Entertainment Weekly o elegeu como o 9° maior cineasta de todos os tempos. Ele foi indicado seis vezes ao Oscar, tendo levado o prêmio de Melhor Diretor em três ocasiões (por Aconteceu Naquela NoiteO Galante Mr. Deeds e Do Mundo Nada se Leva). Capra dirigiu dez performances indicadas ao Oscar, dentre elas, duas das maiores atuações de James Stewart, em A Mulher Faz o HomemA Felicidade Não se Compra. O diretor e o ator (que trabalharam juntos três vezes) revelaram, posteriormente, que o filme de 1946 é o favorito de suas carreiras.
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Frank Capra e James Stewart em um momento descontraído nos sets.
A estreia de A Felicidade Não se Compra nos cinemas foi ofuscada pelo grande sucesso de Os Melhores Anos de Nossas Vidas (1946), filme de William Wyler que havia estreado nos cinemas na semana anterior. O drama de Wyler é centrado na vida de ex-soldados que tentavam retornar às suas vidas normais após a Segunda Guerra Mundial. O fracasso de bilheteria de A Felicidade Não se Compra explica, de certa forma, seu insucesso na premiação do Oscar no ano seguinte, tendo perdido o grande prêmio para Os Melhores Anos de Nossas Vidas e tendo saído de mãos vazias da premiação, apesar das cinco indicações (Melhor Filme, Melhor Diretor, Melhor Ator, Melhor Montagem e Melhor Som). Ainda que o clássico de Wyler seja indiscutivelmente uma obra importante, A Felicidade Não se Compra “envelheceu” melhor e é, normalmente, visto como um filme maior, ocupando um lugar especial no coração de muitos cinéfilos.
A popularidade do filme de Capra aumentou exponencialmente com o passar dos anos, muito em função da televisão, onde costumava ser exibido com frequência, principalmente no período natalino. Ainda que o próprio Capra nunca tenha pensado no filme como uma fábula de Natal, A Felicidade Não se Compra veio a se tornar um dos maiores “filmes natalinos” de todos os tempos. A mensagem edificadora da história é um dos grandes trunfos desse clássico. 
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A cena do primeiro beijo é uma das mais românticas do filme. Assista aqui.
O filme conta a história de George Baily (James Stewart), um homem que passou grande parte da sua vida se compromentendo a ajudar os moradores da pequena cidade de Bedford Falls, a despeito de seu sonho de viajar e conhecer o mundo. O seu maior antagonista é o poderoso e maléfico Mr. Potter (Lionel Barrymore), que anseia ter o controle absoluto da cidade. Através de sua empresa de empréstimo e financiamento, George ajuda as pessoas de Bedford Falls a realizarem seus sonhos. Certo dia, o tio de George perde uma grande quantia da empresa, colocando-a em sério risco de falência. Ainda sob o risco de ser preso e receando deixar sua família na miséria, George chega a conclusão de que vale muito mais morto do que vivo, devido ao valor do seu de seguro de vida. Sem ter a quem recorrer, George pensa em se suicidar em plena véspera de Natal. Nesse momento, o anjo Clarence (Henry Travers) intervém para ajudar o protagonista.
Frank Capra é reconhecido por sua habilidade de realizar grandes obras a partir de histórias relativamente simples. Muitos de seus filmes são centrados em um protagonista masculino, um indivíduo de bom coração e de boas intenções, que tenta se impor em uma sociedade marcada pela corrupção e pela ambição. Capra é normalmente lembrado por seus “feel good movies”, obras marcadas pela idealização do homem e pela fé na humanidade. Os heróis de Frank Capra são homens comuns que simbolizam a alma nacional norte-americana. Tais heróis são construtores de uma América ideal onde reinam a justiça e a liberdade. As narrativas de Capra são também marcadas pelo sentimentalismo e pela ideia de que a coragem individual pode ser páreo ao mal coletivo e de que a integridade dos “pequenos” pode rivalizar com a iniquidade dos poderosos. 
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Lionel Barrymore interpreta um dos vilões mais desprezíveis do cinema clássico.
A Felicidade Não se Compra foi o único filme em que Capra acumulou as funções de diretor, produtor, financiador e co-roteirista (ao lado de Frances Goodrich e Albert Hackett). O custo de filmagens foi considerado extremamente alto para uma produção independente, batendo os 3 milhões de dólares. Para as filmagens, foi fabricado um dos maiores sets da história do cinema americano até então. Uma verdadeira cidade com mais de 75 prédios foi construída para representar a cidadezinha fictícia de Bedford Falls.
A Felicidade Não se Compra foi o primeiro filme de James Stewart após a Segunda Guerra. O ator, que teve uma proeminente carreira militar e que participou ativamente do conflito, ficou cinco anos sem atuar. O filme de 1946 foi, portanto, sua reestreia no cinema. Além de ser o seu personagem favorito, George Bailey é um dos personagens mais icônicos da carreira do ator, também conhecido por suas memoráveis parcerias com Alfred Hitchcock.
Ao lado de James Stewart, temos o grande Lionel Barrymore que encarna Mr. Potter, um dos vilões inesquecíveis do cinema clássico. O ator começou sua carreira no cinema mudo e chegou a trabalhar com o mestre D. W. Griffith. Mr. Potter é o seu mais célebre personagem em quase cinquenta anos de carreira.
Outro destaque do filme é a bela atriz Donna Reed, que interpreta sua primeira protagonista no cinema num papel inicialmente oferecido à estrela Ginger Rogers. Reed viria a ganhar o Oscar de coadjuvante, oito anos depois, por A Um Passo da Eternidade (1953).
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Donna Reed encarnou sua primeira protagonista em A Felicidade Não se Compra.
A obra-prima de Frank Capra é frequentemente citada em diversas listas produzidas por várias associações ligadas ao cinema. O American Film Institute o elegeu como o filme mais inspirador de todos os tempos. Em 2007, a mesma instituição o colocou em 20° lugar, na lista dos 100 melhores filmes americanos de todos os tempos. Mr. Potter foi escolhido com o 6° maior vilão e George Bailey, o 9° maior herói do cinema. A Premiere Magazine classificou a atuação de James Stewart como a 8 melhor de todos os tempos. Além das cinco indicações ao Oscar, o filme levou o Globo de Ouro de Melhor Diretor em 1947.
A Felicidade Não se Compra é, ao lado de O Mágico de Oz (1939) e de De Ilusão Também se Vive (1947), um dos filmes de fantasia mais importantes do cinema clássico hollywoodiano. A encantadora fábula de Natal é uma celebração da amizade e do poder transformador de cada indivíduo no seio de sua comunidade. Algumas das cenas do filme permanecem impactantes na memória afetiva de muita gente. Como não se emocionar ao (re)ver a última cena do filme ao som da "Valsa da Despedida" (Auld Lang Sine)? Ouça.
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No filme, George Bailey (Stewart) tem a oportunidade de ver como seria o mundo se ele nunca tivesse existido.

quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Clássicos da Cinemateca - O Milagre de Anne Sullivan (1962)

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Patty Duke e Anne Bancroft em cena de O Milagre de Anne Sullivan (1962).
Helen Keller (1880-1968) foi uma importante escritora, jornalista, filósofa e ativista política americana. Ela teve uma fase crucial de sua vida transposta para o cinema há 50 anos, em uma obra-prima da sétima arte desconhecida por muitos cinéfilos. O Milagre de Anne Sullivané dirigido por Arthur Penn, cineasta que tem no currículo outro clássico, o mais famoso, Bonnie e Clyde – Uma Rajada de Balas (1967). 
Helen Keller, nascida no Alabama, teve grande importância na luta pelos direitos de pessoas com deficiência. Engajada politicamente e membro do Partido Socialista Americano, a intelectual também é conhecida por sua luta pelos direitos das mulheres e por sua ferrenha oposição à Segunda Guerra Mundial. Ela publicou aos 22 anos sua autobiografia, A História da Minha Vida, e, desde então, não parou de escrever.  
A obra escrita e o trabalho social de Helen Keller são por si só impressionantes, mas é impossível conter uma maior admiração ao saber que a escritora ficou surda e cega aos 19 meses de idade, devido ao que hoje se presume ser escarlatina. 
Keller nasceu no final do século 19, em 1880, em uma pequena cidade do sul dos EUA. Na época, sua enfermidade foi chamada de “febre cerebral”. Até os sete anos, ela era desprovida de qualquer tipo de linguagem. Foi somente com a chegada da professora Anne Sullivan (1866–1936), que Helen foi retirada do isolamento imposto por sua deficiência e dificuldade de comunicação. Anne Sullivan, por sua vez, era praticamente cega. Foi somente após algumas cirurgias que ela recuperou alguns graus de sua visão.
A professora também teve uma bela história de superação. Órfã, ela foi mandada para uma casa de deficientes quando criança, onde morou por muitos anos. Essa experiência foi extremamente marcante em sua vida. Anne Sullivan conseguiu estudar, formar-se e se tornou uma referência no ensino de pessoas com deficiência. 
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As verdadeiras Helen Keller e Anne Sullivan, em foto de 1888.
O Milagre de Anne Sullivan é a adaptação da peça de William Gibson (The Miracle Worker) que conta o encontro de Anne Sullivan e Helen Keller, assim como o início da educação da jovem garota. Apesar de ser baseado em uma peça teatral, o longa-metragem de Arthur Penn possui uma linguagem cinematográfica bastante sofisticada, sendo uma das experiências fílmicas mais interessantes e bem-sucedidas da carreira do cineasta americano. A fotografia em preto e branco é um destaque da produção e confere um tom inquietante e, por vezes, sombrio ao filme.
Arthur Penn presenteia o espectador com uma direção inspirada. A intensa sequência de abertura do filme, que revela a descoberta da deficiência de Helen, parece ter inspirações expressionistas. Outra cena que merece destaque é aquela que mostra a imagem de Helen refletida em uma bola da árvore de Natal, que logo depois se despedaça no chão (o que nos remete à cena do globo de neve do clássico Cidadão Kane). Para dar uma dimensão mais angustiante aos traumas de Anne, o diretor não hesita em usar interessantes sobreposições de imagens.
No entanto, a cena mais célebre do filme envolve uma “batalha” em uma sala de jantar. Nela, Anne tenta disciplinar a rebelde Helen e fazer com que ela coma com um talher à mesa. O resultado é uma das lutas mais longas do cinema. A cena exigiu muito fisicamente de suas atrizes e foi coreografada de maneira exemplar por Penn. 
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Anne Bancroft e Arthur Penn nos bastidores do filme.
E por falar nas atrizes, Anne Bancroft e Patty Duke, que interpretam respectivamente Anne Sullivan e Helen Keller, têm um desempenho notável. A talentosíssima Anne Bancroft encarna com intensidade e carisma sua perseverante personagem. A jovem Patty Duke tem uma performance admirável, em um papel difícil, que seria um grande desafio para qualquer ator mais experiente. Ela tinha apenas 16 anos quando interpretou Helen.
Anne Sullivan e Helen Keller desenvolveram uma relação muito peculiar e o roteiro do filme explora brilhantemente a construção e a evolução dessa relação. Mesmo que os métodos de Anne Sullivan pareçam pouco ortodoxos e, por vezes, violentos, sua preocupação com o aprendizado da garota é também fruto de um amor quase maternal e de uma grande identificação com o drama de Helen. É emocionante assistir ao esforço da professora na busca pela melhor forma de ensinar as palavras a Helen. Patty Duke tem como grande mérito mostrar que mesmo se comportando de forma selvagem e animalesca, sua personagem é um ser dotado de inteligência e sensibilidade, fazendo de tudo para se comunicar e revelando grande facilidade em aprender. 
Além da bela fotografia de Ernesto Caparrós, o filme ainda conta com a impactante trilha sonora composta por Laurence Rosenthal. O Milagre de Anne Sullivan é, sem dúvida, um dos grandes clássicos dos anos 60. O longa-metragem de Arthur Penn mostra de forma realista e emocionante que o ser humano é capaz de superar sua deficiência e suas limitações e, ainda por cima, encontrar forças para ajudar outras pessoas a enfrentarem problemas semelhantes. 
O Milagre de Anne Sullivan ganhou o Oscar de Melhor Atriz (Anne Bancroft) e Melhor Atriz Coadjuvante (Patty Duke) e foi indicado a mais três prêmios, dentre eles o de Melhor Diretor (Arthur Penn).
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Mais sobre O Milagre de Anne Sullivan:
O Milagre de Anne Sullivan é apenas o segundo longa-metragem da carreira de Arthur Penn.
- Arthur Penn dirigiu oito atuações indicadas ao Oscar, dentre elas as de Anne Bancroft e a de Patty Duke, que saíram vitoriosas.
- Arthur Penn foi premiado com um Tony, em 1960, pelo seu trabalho na direção da peça The Miracle Worker na Broadway (a montagem deu origem ao filme dois anos depois).
- William Gibson, autor da peça original, é também o responsável por sua adaptação para o cinema.
- Anne Bancroft e Patty Duke já haviam trabalhado juntas na versão da Broadway. A primeira levou o Tony de Melhor Atriz por sua performance na peça.
- Durante sua carreira, Anne Bancroft conquistou os mais prestigiados prêmios do cinema, do teatro e da televisão, entre eles o Oscar, o Emmy, o Globo de Ouro, o Tony, o BAFTA e o prêmio de melhor atriz em Cannes. Interpretando Anne Sullivan, ela ganhou o Oscar, o Tony, o BAFTA e foi indicada ao Globo de Ouro.
- Anne Bancroft afirmou que Arthur Penn foi o diretor que teve o maior impacto sobre sua carreira.
- Antes de levar a peça The Miracle Worker para o teatro, Arthur Penn e William Gibson fizeram uma versão para a televisão, com diferentes intérpretes, em 1957, em um episódio da série Playhouse 90.
- A United Arts queria que o filme fosse estrelado por Elizabeth Taylor ou Audrey Hepburn. Penn e Gibson, no entanto, insistiram para que o papel fosse dado a Anne Bancroft.
- Patty Duke, que interpreta Helen Keller no filme de 1962, interpretou Anne Sullivan numa versão feita para a televisão em 1979. Ela ganhou o Emmy de melhor atriz por sua performance.
- Patty Duke tinha 16 anos quando ganhou o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante. Após ganhar a estatueta, a atriz passou a se dedicar mais à televisão. Desde então, Duke gerencia uma prolífica e bem-sucedida carreira nas telinhas. De 1963 a 1966, ela protagonizou The Patty Duke Show, uma série de sucesso nos Estados Unidos.
- A famosa cena em que Helen e Anne destroem uma sala de jantar contém apenas duas palavras, “good girl”, pronunciadas por Anne Sullivan. A cena tem mais de oito minutos de duração. Assista à cena:
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sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Clássicos da Cinemateca - Cinco vezes Hitchcock


O dia 29 de abril é marcado pelo aniversário da morte do gênio Alfred Hitchcock. Na edição desta semana da coluna, homenageamos o diretor, falando sobre cinco obras importantes de sua filmografia.
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Alfred Hitchcock (1899-1980)
Pacto Sinistro (1951)
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Pacto Sinistro é um dos filmes mais interessantes de Alfred Hitchcock, ainda que não seja tão conhecido do grande público. O longa-metragem concentra algumas das cenas mais espetaculares da filmografia do diretor inglês, com destaque para as duas célebres sequências que se passam em um parque de diversões. Neste magnífico thriller psicológico, Hitchcock explora brilhantemente o jogo de luz e sombras e o clima de tensão e perversidade, o que nos remete ao gênero noir. O humor característico de Hitchcock continua presente, mas, desta vez, um humor negro, ainda mais ácido do que o de costume.
O filme é centrado em um encontro inusitado e macabro. Certo dia, um promissor jogador de tênis cruza com um sujeito bem peculiar numa viagem de trem. Tal encontro mudará a vida de ambos. Guy Haines, o jovem tenista, é casado com uma mulher interesseira e adúltera. Bruno Antony, o desconhecido, é um bon vivant que tem um pai dominador e rígido. Após uma conversa, Antony propõe um plano de assassinato cruzado: ele mataria a mulher do tenista e este mataria o seu pai. Assim, eles eliminariam os dois incômodos de suas vidas, sem despertar suspeitas. Um plano perfeito? Guy Haines não leva a sério a proposta, mas Bruno não desiste da ideia de executar o plano.
Haines é o perfeito modelo do bom moço. O protagonista joga de acordo com as regras, é bonito, ambicioso e vive um momento de ascensão social. Nada lhe foi dado de graça e ele teve que conquistar tudo em sua vida. Já Bruno tem características opostas. O antagonista nasceu em berço de ouro, não aceita regras, confronta a autoridade do pai, não tem talento, nem ambições particulares e não quer nada da vida, além de realizar suas pulsões imediatas. Em outra interpretação, podemos dizer que Bruno representa os impulsos obscuros de Haines, aqueles que são reprimidos para se viver em sociedade.
Se Guy Haines é interpretado pelo apenas correto Farley Granger, Bruno Anthony é vivido de maneira magistral por Robert Walker, que faz de seu personagem uma das figuras mais interessantes e sedutoras da filmografia de Hitchcock. O ator, que tinha problemas emocionais e problemas com bebidas, teve no filme de Hitchcock o maior trabalho de sua carreita. Infelizmente, o cinema foi privado prematuramente do talento de Walker, que morreu pouco tempo depois do lançamento do filme. No entanto, ele está imortalizado como um dos melhores vilões hitchcockianos. É interessante acrescentar que Hitchcock inclui no filme um ingrediente homoafetivo entre os dois personagens principais.
5 curiosidades sobre Pacto Sinistro:
Em Pacto Sinistro, Robert Walker oferece a performance mais impactante de sua carreira. A Premiere Magazine citou o trabalho de Walker em sua lista das 100 Maiores Atuações de Todos os Tempos.
Pacto Sinistro foi o penúltimo filme de Robert Walker. Ele morreu pouco tempo depois do lançamento do filme, em 1951, aos 32 anos, devido a uma reação alérgica a um medicamento.
- Patricia Hitchcock, filha do diretor, interpreta Barbara Morton no filme. Este é o terceiro filme da atriz.
- Hitchcock afirmou que a cena do carrossel contém o trabalho de dublê mais perigoso que dirigiu. Ele acrescentou que nunca mais autorizaria um dublê a correr aquele tipo de risco.
- Numa primeira versão do roteiro, o personagem de Robert Walker terminaria internado em um manicômio.
Janela Indiscreta (1954)
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Janela Indiscreta é um dos filmes mais queridos e célebres de Alfred Hitchcock. Esse irresistível suspense de 1954 reúne duas das maiores estrelas do cinema hitchcockiano: James Stewart e Grace Kelly. O ator interpreta um repórter/fotógrafo investigativo que quebrou a perna em uma de suas missões e se vê obrigado a ficar de repouso em seu pequeno apartamento. Entediado, o moço se distrai ao acompanhar, na sua janela, a vida de seus vizinhos. Grace Kelly é Lisa, a bela e elegante namorada do protagonista, uma mulher refinada que frequenta a elite novaiorquina e pensa em casamento. Se, a princípio, os namorados parecem ter estilos de vida incompatíveis, Lisa acaba por provar, que assim como o namorado, tem gosto pela aventura e, assim, o conquista definitivamente.
O Jeff de James Stewart é, assim como nós, um espectador e as janelas são como telas de cinema ou canais de televisão. Motivado por sua curiosidade de réporter, o personagem vai constatando o perfil de cada morador, muitos deles baseados em estereótipos: a bailarina sexy, a solteirona, os recém-casados, o pianista boêmio, o casal excêntrico, entre outros. Certa noite, ele observa alguns acontecimentos estranhos em um apartamento em frente, chegando à conclusão de que um homem matou sua esposa. Stewart encarna a figura do voyeur, mas Hitchcock faz com que o espectador também o seja. Ele dirige nosso olhar, nos instiga e, no decorrer do filme, também sentimos que estamos vendo o que não deveríamos, invadindo a privacidade daqueles personagens, fascinados por eles.
5 curiosidades sobre Janela Indiscreta: 
- O filme é inspirado, em parte, em um famoso e verídico caso de assassinato, seguido de esquartejamento, que teria ocorrido na Inglaterra, em 1924.
Janela Indiscreta foi todo filmado em um único set.
- Todos os sons presentes no filme são diegéticos, ou seja, fazem parte do universo ficcional da história, com exceção da música orquestral da abertura composta por Franz Waxman.
Janela Indiscreta foi eleito o 48° melhor filme de todos os tempos pelo American Film Institute e o terceiro melhor filme de mistério pela mesma instituição.
- As filmagens foram rápidas e ocoreram entre 27 de novembro de 1953 e 26 de fevereiro de 1954.
Psicose (1960)
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Psicose, filme de 1960, uma das quatro obras-primas mais conhecidas de Hitchcock, é um clássico do terror/suspense que permanece tão perturbador quanto na época de seu lançamento. O terror do filme advém sobretudo da maestria com que Hitchcock manipula o espectador, a seu bel-prazer, nos deixando a par do que ocorre em um sinistro hotel de beira de estrada, mas nunca nos revelando tudo de uma só vez. 
O filme nos apresenta falsas pistas com relação ao centro de sua intriga. Logo na primeira cena do longa-metragem, a câmera invade um quarto de motel, onde dois amantes aproveitam uma hora furtiva durante o dia. O filme, no entanto, não conta uma história de amor. Depois, a mesma moça do motel rouba uma grande soma de dinheiro do escritório em que trabalha. Tampouco a trama do roubo é o centro do filme. E, por fim, é no mínimo inusitado e surpreendente que a protagonista seja assassinada na metade do filme.
Um dos golpes de gênio de Hitchcock é a maneira com que ele nos despista, para nos apresentar, quase na metade da projeção, uma trama macabra, representada pelo fantástico personagem Norman Bates e o seu hotel no meio do nada. Bates, um dos personagens mais aterrorizantes do cinema, foi imortalizado por Anthony Perkins. É brilhante a forma com que Perkins compõe seu personagem: a princípio, um jovem naturalmente simpático e tímido, que gradualmente vai revelando o seu desequilíbrio. 
A cena mais célebre do longa-metragem é tão famosa, que muitas pessoas a conhecem sem nunca terem visto o filme. Não por acaso ela se tornou um marco na história do cinema e é considerada, até hoje, uma das cenas mais assustadoras de todos os tempos. A sequência é construída através de uma sucessão de cortes rápidos ritmados pela trilha sonora e pelo som da faca. E se observarmos atentamente, vemos que, em nenhum momento, a arma sequer encosta na atriz. A violência está na genial montagem de Hitchcock e na trilha sonora de arrepiar de Bernard Herrmann.
5 curiosidades sobre Psicose: 
- Último filme de Hitchcock em preto e branco.
- O filme foi votado como o sétimo mais assustador de todos os tempos pela revista Entertainment Weekly e ocupa o 14° lugar na eleição de 2007 dos 100 melhores filmes de todos os tempos do American Film Institute.
- A frase "A boy's best friend is his mother" ocupa o 56° lugar na lista de melhores frases do cinema pelo American Film Institute.
- O designer gráfico Saul Bass fez o storyboard da famosa sequência do chuveiro. Existem rumores de que ele também tenha dirigido a cena.
- A cena do chuveiro foi filmada em sete dias, usando 70 ângulos de câmera diferentes. Ela dura 45 segundos.
Os Pássaros (1963)
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Os Pássaros, lançado em 1963, é o último grande clássico de Alfred Hitchcock e um dos filmes mais espetaculares do diretor. A trama do filme é relativamente simples: uma cidade do litoral americano, Bodega Bay, próxima a San Francisco, é o alvo de ataques de aves das mais diversas espécies. Junto a Psicose, este é o filme de Hitchcock que mais se aproxima do terror. Como é de costume em muitas de suas obras, uma mulher (normalmente uma loira platinada) é a responsável pela chegada do "mal" à vida dos outros personagens. Desta vez, quem ocupa esse papel é a atriz Tippi Hedren. A chegada da personagem à cidade é motivada por um namorado em potencial. Logo após, os ataques se iniciam.
Os Pássaros não conta com trilha sonora ou música de nenhum tipo. Os sons das aves e o canto das crianças são utilizados como amplificadores da tensão. A filmagem dos ataques dos pássaros foi extremamente difícil e demandou um trabalho intenso de criação da equipe de efeitos especiais com os recursos disponíveis na época. Tais sequências impressionam até hoje. Uma das últimas cenas do filme, a cena de ataque à personagem de Hedren, foi filmada em uma semana, ao final da qual a atriz teve que ser levada para o hospital para recuperar-se da exaustão.
O brilhantismo do filme consiste justamente na maneira como Hitchcock conseguiu aliar invencionismo e criatividade, para realizar um dos maiores filmes-catástrofes do cinema.
5 curiosidades sobre Os Pássaros: 
- Mesmo não apresentando trilha sonora, o filme contou com a consultoria de Bernard Hermann. De acordo com o compositor Norman Lloyd, foi o próprio Hermann quem aconselhou o não uso de música.
- O filme é baseado num conto de Dauphine Du Maurier, que também escreveu o romance que deu origem a Rebecca, a Mulher Inesquecível (1940), outro clássico de Hitchcock.
- A atriz Tippi Hedren foi descoberta por Hitchcock em um comercial para uma bebida diet em que um homem assovia para ela na rua. A cena de abertura, em que a atriz vai em direção a uma loja de pássaros, é inspirada na propaganda.
- Melanie (Tippi Hedren) utiliza a mesma roupa durante todo o filme. Na verdade, foram feitas seis peças idênticas.
- Foram usadas aves treinadas, aves mecânicas e marionetes.
Marnie – Confissão de uma Ladra (1964)
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Muitos torcem o nariz para Marnie - Confissão de uma Ladra, filme de 1964 de Alfred Hitchcock. Marnie faz parte da fase final da carreira do diretor e não teve um grande orçamento como Os Pássaros, por exemplo. Hitchcock ainda teve diversas dificuldades na realização do filme, inclusive na escolha de seu elenco. O diretor queria Rock Hudson e ganhou Sean Connery para o papel principal. Tippi Hedren também não era a primeira opção.
Marnie é um filme que tem pouco do humor e da irreverência característicos de Hitchcock. A sinopse poderia nos remeter a um filme irreverente e leve como Ladrão de Casaca (1955), observe: uma ladra em série é o alvo da paixão da sua última vítima. Mas o filme é um drama psicológico pertubador e incômodo. Marnie é um dos filmes mais “freudianos” do diretor. Desejo e repulsa ao sexo permeiam a narrativa.
Tippi Hedren dá vida a uma ladra de vários nomes, atormentada por um grande trauma de infância, algo mal resolvido que não permite que ela tenha uma vida normal. O esforço da atriz chega a ser comovente no papel: a personagem é interessante e Hedren dá o máximo que o seu modesto talento permite. Sean Connery, o par romântico da atriz, havia feito a sua estreia como James Bond dois anos antes de estrelar o filme de Hitchcock.
Mesmo que o aspecto psicanalítico seja extremamente importante no filme, a analogia ao mundo animal parece ser ainda mais preponderante. Os personagens de Connery e Hedren são asociados, respectivamente, ao predador e à presa. Uma determinada cena de “estupro” continua a impactar ainda hoje.
Mesmo que não seja um dos filmes mais exemplares do diretor inglês, Marnie é um filme sombrio que combina supense, drama psicológico e melodrama.
5 curiosidades sobre Marnie – Confissão de uma Ladra:
- Inicialmente, o filme seria estrelado por Grace Kelly. O diretor queria que a atriz fizesse seu retorno às telonas neste filme, mas a opinião pública em Mônaco não se mostrou favorável em ver a princesa interpretar uma ladra compulsiva.
- Esta foi a última parceria de Hitchcock com o compositor Bernard Hermann.
- Existem rumores de que Hitchcock e Tippi Hedren tiveram um grande deentendimento durante as filmagens e que, a partir de então, ele passou a dirigi-la através de intermediários.
- Hedren afirmou que Marnie é o seu filme favorito, dentre aqueles nos quais atuou.
- Depois da desistência de Grace Kelly, Hitchcock considerou cerca de seis atrizes antes de dar o papel da protagonista para Hedren.


Leia também a matéria especial sobre Um Corpo Que Cai (1958).

TEXTO DE MINHA AUTORIA PUBLICADO ORIGINALMENTE NA COLUNA CINEMATECA, DO SITE CINEMA EM CENA. 

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Os Melhores Filmes Sobre Esportes

Embalado pelo espírito olímpico, o Clube do Filme buscou na história do cinema algumas obras inspiradas no universo esportivo.

Confira a nossa seleção (em ordem cronológica):

1 - Ídolo, Amante e Herói The Pride of the Yankees (1942) 
Dirigido porSam Wood 
Esporte: Beisebol

2 - Desafio à CorrupçãoThe Hustler (1961) 
Dirigido porRobert Rossen 
Esporte: Sinuca

3 - Os Corredores da MontanhaDownhill Racer (1969) 
Dirigido porMichael Ritchie 
Esporte: Futebol Americano

4 - Golpe BaixoThe Longest Yard (1974) 
Dirigido porRobert Aldrich 
Esporte: Futebol Americano

5 - Garotos em Ponto de Bala / The Bad News Bears (1976) 
Dirigido porMichael Ritchie 
Esporte: Beisebol

6 - Rocky - O Lutador / Rocky  (1976) 
Dirigido porJohn G. Avildsen 
Esporte: Boxe 

7 - Slap Shot (1977) 
Dirigido porGeorge Roy Hill 
Esporte: Hockey

8 - O Céu Pode EsperarHeaven Can Wait (1978) 
Dirigido porWarren BeattyBuck Henry 
Esporte: Futebol Americano 

9 - O VencedorBreaking Away (1979) 
Dirigido porPeter Yates 
Esporte: Ciclismo 

10 - Clube dos PilantrasCaddyshack (1980) 
Dirigido por: Harold Ramis 
Esporte: Golf
11 - Touro Indomável / Raging Bull (1980) 
Dirigido por: Martin Scorsese
Esporte: Boxe

12 - Carruagens de FogoChariots of Fire (1981) 
Dirigido porHugh Hudson 
Esporte: Atletismo

13 - Karate Kid - A Hora da Verdade The Karate Kid (1984) 
Dirigido por: John G. Avildsen
Esporte: Karatê
14 - Um Homem Fora de SérieThe Natural (1984) 
Dirigido porBarry Levinson 
Esporte: Beisebol

15 - Momentos DecisivosHoosiers (1986) 
Dirigido porDavid Anspaugh 
Esporte: Basquete

16 - Fora do Jogo / Eight Men Out (1988) 
Dirigido porJohn Sayles 
Esporte: Beisebol

17 - Sorte no AmorBull Durham (1988) 
Dirigido porRon Shelton 
Esporte: Beisebol

18 - Campo dos SonhosField of Dreams (1989) 
Dirigido porPhil Alden Robinson 
Esporte: Beisebol

19 - Uma Equipe Muito EspecialA League of Their Own (1992) 
Dirigido porPenny Marshall 
Esporte: Beisebol

20 - Jamaica Abaixo de ZeroCool Runnings (1993) 
Dirigido porJon Turteltaub 
Esporte: Bobsled
21 - Rudy / Rudy (1993) 
Dirigido porDavid Anspaugh 
Esporte: Futebol Americano 



22 - Jerry Maguire - A Grande Virada / Jerry Maguire (1996) 
Dirigido porCameron Crowe 
Esporte: Futebol Americano

23 - O Jogo da Paixão / Tin Cup (1996) 
Dirigido porRon Shelton 
Esporte: Golf

24 - Duelo de TitãsRemember the Titans (2000) 
Dirigido porBoaz Yakin 
Esporte: Futebol Americano


25 - Driblando o Destino / Bend It Like Beckham (2002) 
Dirigido porGurinder Chadha 
Esporte: Futebol 

26 - Desafio no Gelo / Miracle (2004) 
Dirigido porGavin O'Connor  
Esporte: Hockey

27 - Menina de Ouro / Million Dollar Baby (2004) 
Dirigido porClint Eastwood 
Esporte: Boxe

28 - Wimbledom - O Jogo do Amor /  Wimbledon (2004) 
Dirigido porRichard Loncraine 
Esporte: Tênis

29 - Ponto Final - Match Point / Match Point (2005)
Dirigido por: Woody Allen
Esporte: Tênis

30 - O Lutador / The Wrestler (2008)
Dirigido porDarren Aronofsky
Esporte: Luta livre

31 - O Vencedor The Fighter (2010) 
Dirigido porDavid O. Russell 
Esporte: Boxe

32 - O Homem Que Mudou o Jogo Moneyball (2011) 
Dirigido porBennett Miller
Esporte: Beisebol

33 - Guerreiro / Warrior (2011)
Dirigido porGavin O'Connor
Esporte: Boxe


segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Clássicos da Cinemateca - Casablanca (1942)


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Humphrey Bogart e Ingrid Bergman
Em 26 de novembro de 1942, Casablanca estreava em Nova York. O longa-metragem foi lançado em plena Segunda Guerra Mundial (1939-1945), que ainda estava longe de ter um fim. A première do filme foi antecipada devido a um fato histórico. Alguns dias antes, em 8 de novembro de 1842, as tropas aliadas (que se opunham à Alemanha de Hitler) invadiram a cidade marroquina de Casablanca que, até então, estava sob a regência da França de Vichy, de influência nazista. A publicidade vinda dessa invasão foi um dos fatores que contribuíram para a ótima bilheteria que o longa-metragem teve nos Estados Unidos.   
Devido à guerra, o filme demorou a ser exibido na Europa. Na Itália, ele estreou em 1946, na França, em 1947, na Áustria, em 1948, e na Alemanha Ocidental, apenas em 1952, em uma versão com cortes. Na Alemanha Oriental, Casablanca estreou diretamente na televisão, somente em 1983! Os brasileiros, por sua vez, puderam conferir o longa-metragem menos de um mês após sua estreia nos Estados Unidos, em 7 de dezembro de 1942. O filme foi produzido por Hal B. Wallis, importante nome do estúdio Warner Bros. As filmagens deCasablanca duraram menos de três meses (o início das filmagens já havia sido adiado em mais de um mês) e foram feitas quase inteiramente em estúdio. Casablanca foi quase todo filmado em sequência, ou seja, seguindo os acontecimentos da trama, o que é bastante raro. Isso se explica pelo fato de que apenas parte do roteiro estava pronto no início das filmagens.
Casablanca conta a história de Rick Blaine, um americano amargo e cínico que vive e trabalha em Casablanca, onde tem um badalado café. Rick’s Café é frequentado tanto por nazistas, funcionários franceses, quanto por refugiados e criminosos. Um belo dia, Ilsa Lund, o grande amor do passado de Rick, aparece em seu bar ao lado do marido, Victor Laszlo, herói da resistência tcheca. O reencontro dos ex-amantes reacende o amor entre eles. O filme foi indicado a oito Oscars e levou três estatuetas: Melhor Filme, Melhor Diretor e Melhor Roteiro. 
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Mesmo tendo grande química nas telas e tendo interpretado um dos casais mais célebres do cinema, os atores não voltaram a trabalhar juntos.
Em 2006, o Sindicato de Roteiristas dos Estados Unidos elegeu o roteiro do filme como o melhor de todos os tempos. Ironicamente, o roteiro foi terminado a duras penas, somente durante as filmagens. Muitas vezes, mudanças eram realizadas no próprio set, pouco antes das cenas serem rodadas. Escrito por pelo menos quatro roteiristas (dos quais apenas Howard Koch e os gêmeos Julius e Philip Epstein foram creditados), o filme é a adaptação da peça Everybody Comes to Rick's, escrita por Murray Burnett e Joan Alison no final dos anos 30. É curioso acrescentar que a peça não havia sido produzida e que ela só estreou nos palcos numa montagem recente, em 1991, em Londres. A origem da trama de Casablanca é inclusive desconhecida por muitos. Em uma entrevista nos anos 70, Ingrid Bergman, estrela do filme, afirmou desconhecer que o filme tenha sido baseado numa peça. 
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Dooley Wilson era um dos poucos membros do elenco 
que de fato conheciam a cidade de Casablanca.
A recepção de Casablanca na época de seu lançamento foi extremamente positiva, com excelentes críticas que elogiavam, sobretudo, a maneira com a qual o filme combinava humor, melodrama, romance e História. Ainda que seja considerado um dos maiores filmes de todos os tempos e que esteja em praticamente todas as listas feitas nesse sentido, o longa tem alguns surpreendentes detratores. Pauline Kael afirmou que Casablanca não chega a ser um grande filme e que é o romantismo presente nele que o faz particularmente atraente. Jonathan Rosenbaum, outro crítico americano, disse que Casablanca é um filme feito às pressas e que é qualitativamente inferior a Uma Aventura na Martinica (1944), que seria umspin-off do clássico de 1942. O filme de 1944 foi dirigido por Howard Hawks e também foi estrelado por Humphrey Bogart.
Em um artigo de 1975, o grande semiólogo italiano Umberto Eco vai ainda mais longe e explica por que considera Casablanca um filme medíocre, esteticamente falando. Dentre os problemas apontados pelo estudioso, estão a fraca verossimilhança psicológica dos personagens e as reviravoltas que ocorrem sem razões plausíveis. Ele acrescenta que os defeitos do filme se devem à maneira com a qual o roteiro foi escrito, à medida que as filmagens avançavam, o que fez com que os roteiristas acumulassem todos os clichês de Hollywood.
O sucesso de Casablanca pode ser considerado como o resultado de uma combinação de golpes do destino ou acidentes de percurso. Além da questão do roteiro, alterado até o último minuto, algumas anedotas provam que o filme era destinado a ser um clássico. A canção "As Time Goes By", de Herman Hupfeld, escrita em 1931, era citada na peça Everybody Comes to Ricky’s. Max Steiner, o compositor da trilha sonora do filme, queria, no entanto, retirar a música e substituí-la por uma composição original. A substituição só não foi realizada por que Ingrid Bergman já havia cortado o cabelo bem curto para o filme Por Quem os Sinos Dobram?(1943), e não poderia, portanto, refazer as cenas. Para a nossa sorte, a canção não foi alterada e é considerada hoje uma das melhores músicas do cinema (segundo lugar em votação realizada pelo AFI).
"As Times Goes By" - clique para ouvir
Em um comunicado de imprensa durante a pré-produção do filme, a Warner Bros. havia anunciado que o ator Ronald Reagan (que se tornaria presidente americano quatro décadas depois) interpretaria Rick. Reagan, no entanto, teve que se apresentar ao exército para dar continuidade a seu serviço militar. Felizmente, o papel acabou ficando com Humphrey Bogart. A principio, Ingrid Bergman também não daria vida a Ilsa Lund e outras atrizes foram consideradas para o papel. Bergman tinha contrato exclusivo com o produtor David O. Selznick. Foi necessário enviar os irmãos Epstein para convencer o poderoso produtor a ceder Bergman para o projeto. Selznick se manteve inflexível, até que Julius desistiu e disse: “Quem se importa! (Casablanca) é uma porcaria como Algiers (filme de 1938) mesmo!” Foi quando Selznick concordou com o empréstimo da atriz.
Paul Heinred, que interpreta o marido de Ilsa, também foi emprestado por Selznick. O ator se viu obrigado a fazer o filme contra sua vontade. Dizem que Heinred temia interpretar um papel secundário, pois atrapalharia sua carreira de galã. Uma das falas mais famosas do filme também é resultado de um golpe do destino. "Here's looking at you, kid" teria sido improvisada por Bogart em uma das cenas do filme. Rumores, no entanto, dizem que ela foi inventada quando o ator assistia a Ingrid Bergman jogar poker com membros da equipe. Por fim, Michael Curtiz não era a primeira opção do produtor Hal B. Wallis para dirigir o filme. Wallis queria William Wyler, que teve que declinar pois estava envolvido em outros projetos.
É interessante constatar pelos depoimentos sobre o filme que a maioria dos envolvidos na produção de Casablanca não acreditava estar fazendo algo extraordinário e, sim, mais um filme dos mais de 100 lançados a cada ano em Hollywood na época. Surpreendendo a todos,Casablanca veio a se tornar um dos maiores sucessos comerciais de todos os tempos da Warner Bros.
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Claude Rains, Paul Heinred, Ingrid Bergman e Humphrey Bogart
Michael Curtiz, ou Manó Kertész Kaminer, nasceu na Hungria em 1886. O diretor fez cerca de 50 filmes na Europa até ser convidado por Jack Warner, em 1926, para trabalhar nos Estados Unidos, onde sua carreira se consolidou. Curtiz é um dos cineastas mais importantes e prolíficos da Era de Ouro de Hollywood. Sua filmografia é a síntese da natureza espetacular do cinema clássico. Nela, encontramos vários personagens típicos do folclore hollywoodiano: o pirata, o fora-da-lei, o boxeador, o gângster, o cowboy etc. Curtiz dirigiu do musical ao filme de terror, passando pelo melodrama, pelo filme de capa e espada, pelo filme noir, pelo bíblico, entre outros. Curtiz tem no currículo nada menos que 170 créditos como diretor! O cineasta trabalhou para a Warner até o início dos anos 50. Ele era considerado o “faz-tudo” dos produtores Jack Warner e Hal Wallis, mas sua extrema produtividade não diminuía a qualidade de suas obras. Curtiz é um dos grandes responsáveis pela criação do estilo Warner, ou seja, por ter dado ao estúdio uma identidade própria.
Casablanca é visto como um dos maiores filmes do diretor, mas ele dirigiu outros clássicos inesquecíveis como: As aventuras de Robin Hood (1938­), Alma em suplício (1945), O Gavião do Mar (1940), A Canção da Vitória (1942) e Natal branco (1954). Além de ser conhecido pela sua dificuldade com a língua inglesa, o que gerava diversas confusões nos sets de filmagem, Curtiz era famoso por sua personalidade forte, sua rigidez, seu espírito incansável e seu perfeccionismo. O diretor costumava ter uma relação bem difícil com os seus atores. Diz-se que, certa vez, ele ofendeu Bette Davis e ela se recusou a trabalhar com ele novamente. 
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Michael Curtiz
Curtiz não era o único estrangeiro nas filmagens de Casablanca. Podemos até mesmo dizer que os sets de filmagem eram uma verdadeira Torre de Babel. Para se ter uma ideia, dos atores creditados no filme apenas três eram nascidos nos Estados Unidos: Humphrey Bogart, Dooley Wilson e Joy Page. Ingrid Bergman era sueca, Paul Henreid era austríaco, Claude Rains era inglês, Madeleine LeBeau era francesa e Conrad Veidt era alemão. Este último, que interpreta o Major Strasser no filme, interpretou diversos vilões nazistas durante sua carreira em Hollywood. Na vida real, o ator era um ferrenho opositor do regime nazista, tendo sido obrigado a fugir da Alemanha em 1933, pois seu assassinato já havia sido encomendado. Aliás, muitos dos atores que interpretaram nazistas no filme eram de fato judeus alemães que haviam se exilado nos Estados Unidos. Na cena onde é cantada "La Marseillaise", houve uma real comoção nos sets, já que muitos dos figurantes também tinham escapado da perseguição política e não conseguiram deixar de se emocionar. 
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A estreia de Casablanca foi antecipada para aproveitar 
a publicidade da invasão dos aliados no norte da África.
Humphrey Bogart costumava dizer que Casablanca era a melhor obra de sua filmografia. Sem dúvida, o clássico de 1942 representou uma reviravolta em sua carreira. Até então, o ator era identificado a papéis de detetive ou de gângster. A partir de Casablanca, Bogart se transformou no arquétipo do herói romântico, aparentemente cínico e frio, mas que, no fundo, possui um bom coração. A maravilhosa Ingrid Bergman, por sua vez, que já havia chamado a atenção em Intermezzo (1936), faz de Ilsa uma de suas mais marcantes personagens. É interessante lembrar que até a filmagem da última cena, não se sabia ao certo com quem Ilsa terminaria: se com Rick ou com Victor Laszlo. A decisão sobre o final do filme foi uma das mais complicadas que os roteiristas tiveram que tomar. No início das filmagens, Bergman perguntou a Curtiz por quem sua personagem era apaixonada e ele respondeu para ela interpretar “entre os dois”, ou seja, para conferir certa ambiguidade aos sentimentos de Ilsa, justificando qualquer que fosse a decisão tomada para o final do filme.
Casablanca completa 70 anos em 2012. O filme, que é considerado por muitos o mais romântico da história do cinema, é também um dos mais amados de todos os tempos. Algumas obras parecem ser destinadas ao sucesso. Diversos fatores contribuíram para a fabricação desta obra-prima: desde a criação tumultuada do roteiro, até a escalação do ótimo elenco, passando pela grande direção de Michael Curtiz. Por muito pouco, Casablanca poderia ser um filme completamente diferente. Para nossa sorte, ao final, todos estavam no lugar certo, na hora certa. Até mesmo o espectador dos anos 2000 terá dificuldade em não se encantar pelo olhar apaixonado de Ingrid Bergman, ou admirar o humor ácido de Humphrey Bogart ou mesmo se emocionar ao ver a cena de "La Marseillaise". Casablanca é e continuará sendo uma das melhores histórias de amor e sacrifício já contadas no cinema. 
Algumas frases famosas de Casablanca:
"Tantos bares, em tantas cidades em todo o mundo, e ela tinha que entrar logo no meu."
- "Beije-me. Beije-me como se essa fosse a última vez."
- "Nós sempre teremos Paris."
- "Este é o começo de uma bela amizade."
Isso foi o barulho de um canhão ou o meu coração que deu um salto?"
- “Prendam os suspeitos de sempre!”
TEXTO DE MINHA AUTORIA, PUBLICADO ORIGINALMENTE NO DIA 11/04/2012 NA COLUNA CINEMATECA, DO SITE CINEMA EM CENA.