Título original: The Miracle Worker
Lançamento: 1962
País: EUA
Direção: Arthur Penn
Atores: Anne Bancroft, Patty Duke, Victor Jory, Inga Swenson, Andrew Prine.
Duração: 107 min
Gênero: Drama
Cena de O milagre de Anne Sullivan (1962)
|
Helen Keller foi uma importante escritora, jornalista, filósofa e ativista política americana. Ela teve uma fase crucial de sua vida transposta para o cinema em 1962, em uma obra-prima da sétima arte. O filme foi dirigido por Arthur Penn, cineasta que tem no currículo outro clássico, o mais famoso, Bonnie e Clyde – Uma rajada de balas (1967). A autora, nascida no Alabama, teve grande importância na luta pelos direitos de pessoas com deficiência. Engajada politicamente e membro do Partido Socialista Americano, Keller também é conhecida por sua luta pelos direitos das mulheres e por sua oposição à Segunda Guerra Mundial. Ela publicou aos 22 anos sua autobiografia, “A história da minha vida”, e, desde então, não parou de escrever.
A obra escrita e o trabalho social de Helen Keller são por si só impressionantes, mas é impossível conter uma maior admiração ao saber que a escritora ficou surda e cega aos 19 meses, devido ao que hoje se presume ser escarlatina. Keller nasceu no final do século XIX, em 1880, em uma pequena cidade do sul dos EUA. Na época, sua enfermidade foi chamada de “febre cerebral”. Até os sete anos, ela era desprovida de qualquer tipo de linguagem. Foi somente com a chegada da professora Anne Sullivan, que Helen foi retirada do isolamento imposto por sua deficiência e dificuldade de comunicação. Anne Sullivan, por sua vez, era praticamente cega. Foi somente após algumas cirurgias que ela recuperou alguns graus de sua visão. A professora também teve uma bela história de superação. Órfã, ela foi mandada para uma casa de deficientes quando criança, onde morou por muitos anos. Essa experiência foi extremamente marcante em sua vida. Anne Sullivan conseguiu se formar e se tornar uma referência no ensino de pessoas com deficiência.
O milagre de Anne Sullivan é a adaptação da peça de William Gibson (The Miracle Worker) que conta o encontro de Anne Sullivan e Helen Keller, assim como o início da educação da jovem garota. Apesar de ser baseado em uma peça teatral, o longa-metragem de Arthur Penn possui uma linguagem cinematográfica extremamente sofisticada, sendo uma das experiências fílmicas mais interessantes e bem-sucedidas da carreira do cineasta americano. A fotografia em preto e branco é um destaque da produção. Ela confere um tom inquietante à obra, lembrando, em muitas sequências, um filme de horror.
Arthur Penn presenteia o espectador com uma direção inspirada. A intensa sequência de abertura do filme revela a descoberta da deficiência de Helen e parece ter inspirações expressionistas. Outra cena que merece destaque é aquela que mostra a imagem de Helen refletida em uma bola da árvore de natal, que logo depois se despedaça no chão (provável homenagem à cena do globo de neve do clássico Cidadão Kane). Em outros momentos, principalmente naqueles envolvendo o trauma de Anne, Penn não hesita em usar a sobreposição de imagens, com o intuito de conferir um caráter onírico e perturbador a essas cenas. No entanto, a sequência mais célebre do filme envolve uma batalha em uma sala de jantar. Nesta sequência, Anne tenta disciplinar Helen e fazer com que ela coma com um talher à mesa. O resultado é uma das lutas mais longas do cinema. A cena exigiu muito fisicamente de suas atrizes e foi coreografada de maneira exemplar por Penn.
E por falar nas atrizes, Anne Bancroft e Patty Duke, que interpretam respectivamente Anne Sullivan e Helen Keller, têm um desempenho notável. Anne Bancroft encarna com intensidade e muito carisma sua perseverante personagem. A jovem Patty Duke tem uma performance extraordinária, em um papel muito difícil e que é um desafio para qualquer ator. Ela tinha apenas 16 anos, quando interpretou Helen. A química entre as atrizes é determinante para o sucesso do filme. Anne Sullivan e Helen desenvolvem uma relação muito peculiar e o roteiro focaliza a construção dessa relação. Mesmo que os métodos de Anne Sullivan pareçam pouco ortodoxos ou até mesmo violentos, sua preocupação com o aprendizado da garota é também fruto de um amor quase maternal e de uma grande identificação com o drama de Helen. É interessante assistir o esforço da professora em buscar a melhor forma de ensinar Helen as palavras. Patty Duke tem como grande mérito mostrar o conflito de sentimentos de sua personagem, que mesmo se comportando de forma bestial, é um ser que faz de tudo para se comunicar e que tem grande facilidade em aprender.
A já mencionada bela fotografia de Ernesto Caparrós merece elogios, assim como a trilha sonora composta por Laurence Rosenthal, que é linda, eficiente e, em vários momentos, angustiante. O milagre de Anne Sullivan é emocionante não só por se tratar de uma história verídica de duas grandes mulheres, mas também por mostrar de forma realista e intensa que todo ser humano é capaz de superar qualquer tipo de deficiência e ainda por cima encontrar forças para ajudar outras pessoas a enfrentarem problemas semelhantes. O milagre de Anne Sullivan ganhou o Oscar de Melhor Atriz (Anne Bancroft) e Melhor Atriz Coadjuvante (Patty Duke) e foi indicado a mais três prêmios, entre eles ao de Melhor Diretor (Arthur Penn).
Assista ao trailer:
Autobiografia:
A história da minha vida
Helen Keller
Editora: José Olympio
|
Hey, acabei de ter seu blog recomendado e adorei! Um texto ótimo explorando ao máximo o filme, bacana. Vi recentemente O Milagre de Anne Sullivan e é um filme que merece uma atenção especial. Patty e Anne estão assombrosas e a cena da mesa de jantar é maravilhosa, hehe.
ResponderExcluirAbraços, vou aproveitar para seguir aqui e no twitter.
Lembro que quando vi esse filme pela primeira vez - nunca esqueci a tal cena do "café" onde há um duelo emocional e físico entre Anne e Helen, essa sequência tem mais de 8 minutos e é um primor de direção, sem falar nas atuações de Bancroft e Patty Duke que, definitivamente, mereceram os Oscars. Você citou bem essa sequência em teu texto!
ResponderExcluirO filme fala sobre as dificuldades, da sensibilidade e, claro, da maneira como uma surda-muda não só conheceu seus próprios limites, mas aprendeu a "conhecer" o mundo, ainda que sem a visão...seus "sentidos" foram despertados por outra forma...e ela despertou pra um mundo, até então, desconhecido.
O filme nos toca mesmo, acho que é um dos clássicos mais contundentes já realizados, até hoje. Imbatível! Eu não me canso de recomendar. E acho que professores de educação devem usá-lo, sempre. É material didático, acima de tudo.
Abraço, belo texto!