domingo, 22 de janeiro de 2012

O Homem que Mudou o Jogo - 2011

Título original: Moneyball
Lançamento: 2011 
País: EUA
Direção: Bennett Miller
Atores: Brad Pitt, Robin Wright, Philip Seymour Hoffman, Jonah Hill.
Duração: 133 min
Gênero: Drama


Billy Beane (Brad Pitt) e Peter Brand (Jonah Hill) em cena do filme


Assim como existem comédia, drama, terror, suspense, será que podemos reivindicar um gênero "esporte" para o cinema? Grande parte dos filmes que giram em torno de uma prática esportiva compartilha códigos, clichês e fórmulas próprios, o que nos permitiria defender a ideia de um gênero a parte. De qualquer forma, sendo gênero ou subgênero, ótimos filmes já foram produzidos sobre os mais variados tipos de esporte, a maioria deles dando grande importância ao poder da superação. O boxe parece ser a modalidade esportiva mais privilegiada, tendo inspirado grandes filmes, como Rocky, um lutador (1976), Touro Indomável (1980), Menina de Ouro (2004) e O Vencedor (2010). Outras modalidades, no entanto, também já tiveram o privilégio de serem retratadas no cinema: o futebol (Driblando o destino - 2002), o atletismo (Carruagens de fogo - 1981), o bobsleigh (Jamaica abaixo de zero - 1993), o tênis (Wimbledon, O Jogo do Amor - 2004), o vale-tudo (O Lutador - 2008), o surfe (Tá dando onda - 2007), o rugby (Invictus - 2009), a sinuca (Desafio à Corrupção - 1961) e a lista continua... 

Uma das primeiras produções hollywoodianas a focalizar o mundo esportivo foi Ídolo, Amante e Herói (1942). Este clássico, pioneiro do "gênero", é protagonizado por Gary Cooper e conta a história de Lou Gehrig, famoso jogador americano de baseball . Sobre este esporte, um dos favoritos dos norte-americanos, foram feitos também Um homem fora de série (1984) e Uma Equipe Muito Especial (1992). Juntando-se a essa lista, temos o novo filme de Bennet Miller (Capote - 2005) que vem recebendo boas doses de elogios e que, ao que tudo indica, dará a Brad Pitt sua terceira indicação ao Oscar. Trata-se de Moneyball (ou O Homem que Mudou o Jogo, sua piegas tradução brasileira). 

Moneyball é a adaptação do livro Moneyball: The Art of Winning an Unfair Game, escrito por Michael Lewis. A trama do livro e do filme gira em torno da história verídica de Billy Beane, gerente geral (general manager ou GM em inglês) do time Oakland Athletics, que se destacou por conseguir montar uma equipe bem sucedida através de um método inovador, baseado em estatísticas, e contando com poucos recursos financeiros. O gerente geral é o responsável pelas contrações de jogadores e negociações com outros times, sendo uma figura essencial no mundo do baseball. O roteiro do filme foi escrito pelos renomados e premiados Steve Zaillian (A Lista de Shindler - 1993) e Aaron Sorkin (A Rede Social - 2010). 

É interessante salientar que o filme provavelmente terá menos impacto sobre os brasileiros, por exemplo, do que tem sobre os próprios americanos. Esse fenômeno ocorre porque o baseball é um esporte de pouca visibilidade no Brasil, cujas regras a maioria de nós ignoramos (ainda não posso afirmar que sei o que é homerun). Nos Estados Unidos, ao contrário, o esporte está inserido no cotidiano das pessoas, incluído na cultura do país, como é o futebol para nós. Certamente, parte do carinho que o filme vem recendo, é fruto do amor que os americanos nutrem pelo baseball. Uma fala de Beane (Pitt) parece expressar bem o sentimento que o esporte provoca no povo americano: "Como não ser romântico com o baseball?". Mas não somente este fanatismo nacional explica o sucesso do filme nos Estados Unidos, uma vez que a produção apresenta também muitas qualidades. 

É muito bem-sucedida a estratégia utilizada pelos roteiristas de fazer com que o espectador mergulhe nos bastidores de um time de baseball e conheça seu funcionamento e hierarquia. Chega a ser fascinante admirar o mercado de jogadores, as trocas, as barganhas e as negociações. Grandes momentos do longa-metragem estão associados às cenas em que vemos Beane e seu traquejo e habilidade (ou, por vezes, falta deles) na hora de conseguir um tão sonhado jogador. O filme ainda exibe toda a seriedade e arte por trás da montagem de uma equipe, na seleção dos jogadores, na análise de suas qualidades e defeitos. Ao dedicar o primeiro ato do filme à montagem do time, os roteiristas nos convidam a partilhar o desafio de Beane que é o de fazer com que o Oakland Athletics consiga rivalizar com os grandes (e mais endinheirados) times. Por participar desde essa primeira etapa, o espectador tende a se envolver cada vez mais com a história, tornando-se também um torcedor. 

É interessante constatar que o roteiro focaliza muito mais a relação do protagonista com o time que ele defende do que a preparação do time e a transformação do mesmo. Ao invés de criar uma narrativa que mostra como um conjunto de jogadores medianos e desacreditados consegue evoluir e alcançar o sucesso, Moneyball opta por se concentrar nas jogadas realizadas por Beane, para superar as dificuldades e o ceticismo dos colegas e da mídia e fazer com que o time consiga se destacar na Major League. As imagens dos jogos são raramente mostradas diretamente, sendo, na maioria das vezes, exibidas como transmissões da televisão, o que implica um espectador. Dessa forma, fica claro que o que mais importa não é o jogo em si, mas a relação das pessoas com o esporte. 

O roteiro acerta também ao fazer de Beane, uma figura intrigante, interessante e complexa. Muito de sua história resta lacunar, como o que gerou seu divórcio ou como ele fez a transição de jogador para gerente geral. Beane é um homem determinado, extremamente objetivo, impulsivo, sincero e talvez obsessivo. Provavelmente frustrado com suas decisões do passado, ele tenta compensar algo através do time que gerencia. Claramente ele põe a carreira à frente de sua vida pessoal. O filme nem sugere uma vida amorosa para o protagonista, a única mulher de sua vida é a filha adolescente. Todas as atenções do personagem são voltadas para o time e, ao final, torna-se evidente que existe também uma questão ideológica  que o motiva. 

No entanto, nem tudo é perfeito no segundo filme de Bennett Miller. Após uma primeira metade notável, o filme cai sensivelmente na segunda. Apesar de não se tornar propriamente cansativa, a narrativa se torna por vezes arrastada e a sensação que fica é que o filme poderia ter sido mais enxuto. Considero também um desperdício, o fato de que o personagem do treinador (interpretado pelo fantástico Philip Seymour Hoffman) seja tão mal aproveitado pelo roteiro. Sendo um dos que se opõe de forma mais veemente a Beane, seria interessante se a relação entre os dois personagens fosse mais explorada ou se, ao menos, pudéssemos saber mais sobre o treinador ou vê-lo em ação, preparando o time. O roteiro investe, por outro lado, na relação entre Beane e Peter Brand (Jonah Hill), economista que se torna o braço direito do protagonista. Por mais que o início da relação dos dois personagens soe forçada, a dinâmica da parceria entre os dois é um dos pontos altos do filme. Ao final, é divertido notar que Peter passa usar o mesmo método de questionamento incisivo de Beane. 

Em seu segundo longa-metragem de ficção, Bennett Miller comprova ser um cineasta promissor e muito interessante. Há uma tensão constante no filme, que confere à história dramaticidade e um clima muito menos leve do que poderia ter. O diretor também faz um interessante uso do som, ao incluir a narração e os comentários dos jogos de forma quase opressora no filme. Por vezes, tais narrações parecem ser a voz de desaprovação da consciência do protagonista. Assim como em Capote, existe certa frieza na bela fotografia (do premiado Wally Pfister) que foge dos tons fortes. No campo das atuações, o destaque absoluto é Brad Pitt, que faz seu melhor trabalho em anos, conferindo várias nuances ao seu personagem (e devo confessar que não gosto do ator). O resto do elenco, em grande parte masculino, realiza um bom trabalho. Gosto particularmente da participação dos atores veteranos que compõe a cúpula de Beane. Jonah Hill, o gordinho de Superbad (2007), está adorável, com sua expressão sempre atônita, mas as indicações a prêmios que vem recebendo talvez sejam exageradas. Hoffman (que já havia trabalhado com Miller em Capote) é boicotado pelo roteiro e tem pouco o que fazer com seu personagem.

O Homem que Mudou o Jogo é um filme que não decepciona, podendo conquistar até mesmo aqueles que não sabem nada de baseball (como eu). Mesmo com suas falhas, o roteiro do filme consegue se destacar por não se render completamente aos clichês do "gênero", falando de superação, sem soar meloso e revelando-se uma bela declaração de amor ao esporte. 





Um comentário:

  1. MARILIA RAQUEL ALMEIDA24 de janeiro de 2012 às 01:39

    cOMO SEMPRE lEO, VC SE SUPERA A CADA ANALISE CRITICA. cOM OBJETIVIDADE, GRANDE CONHECIMENTO DA AREA, VC SO FAZ BEM AOS AMANTES DO CINEMA.
    bEIJAO, MARILIA RAQUEL

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