Título original: Fish Tank
Lançamento: 2009
País: Inglaterra
Diretora: Andrea Arnold
Atores: Katie Jarvis, Michael Fassbender, Kierston Wareing e Rebecca Griffiths
Gênero: Drama
Katie Jarvis interpreta a protagonista Mia |
A inglesa Andrea Arnold realizou seu primeiro filme, o curta-metragem Milk (1998), aos 37 anos. Em seu terceiro trabalho como diretora, ela foi agraciada com o Oscar de Melhor Curta-metragem, por Wasp (2003). Red Road (2006), seu primeiro longa-metragem, recebeu diversos elogios e foi bastante premiado, principalmente na Europa, levando, por exemplo, o prêmio do Juri no Festival de Cannes. Em 2009, ela lançou Fish Tank (2009), premiado como melhor filme britânico pelo BAFTA, também ganhador do Prêmio do Juri em Cannes, além de muitos outros prêmios nos Estados Unidos e na Europa. Este ano, a diretora lançou, no Festival de Veneza, sua adaptação do clássico O Morro dos Ventos Uivantes, que teve uma recepção mista, mas não indiferente. A indústria cinematográfica é amplamente dominada por diretores masculinos. Uma mulher só foi levar o Oscar de Direção em 2010 (Kathryn Bigelow por Guerra ao Terror). Andrea Arnold se destaca, portanto, por ter conseguido seu espaço, em um cenário ainda tão machista. Ela é, sem dúvida, uma das cineastas mais interessantes que surgiram nos últimos anos.
Fish Tank (Aquário em português) retrata um tipo de organização familiar, infelizmente comum, que pode ser encontrado em vários lugares do mundo, não só em Essex, onde o filme se passa. Trata-se de uma família em que a mãe, solteira, que teve filhos provavelmente muito jovem, não tendo nenhum preparo psicológico para cuidar dos mesmos, deixa que eles se criem sozinhos. No filme, Mia (Katie Jarvis), 15 anos, é uma adolescente agressiva, "boca-suja", rebelde, solitária, que sonha em se tornar dançarina de Hip-Hop. Ela mora com a irmã, Tyler (Rebecca Griffiths) de nove anos, que bebe e fuma, e com sua mãe, Joanne (Kierston Wareing), que pouco se preocupa com as filhas e que não hesita em organizar festas-orgia no pequeno apartamento em que elas vivem. Certo dia, Mia se depara, em sua cozinha, com o novo namorado da mãe, Connor (Michael Fassbender), um belo homem de aproximadamente 30 anos. Uma relação bastante incomum nasce entre eles, no que podemos chamar de iniciação erótica da adolescente.
Mia em seu "aquário" |
Por que Fish Tank (aquário)? As razões podem ser múltiplas. O mais óbvio seria afirmar que o aquário é a própria metáfora da situação de Mia, uma adolescente presa em uma redoma de violência e de falta de afetividade. O desejo de libertação da garota é representado por sua insistência em soltar uma égua velha acorrentada em um terreno baldio, perto de sua casa. O fato de Mia constantemente olhar através do vidro das janelas e mesmo a estrutura da sala onde ela ensaia também nos remete ao aquário. Se considerarmos que Mia é aproximada à figura do peixe, a cena em que Connor captura um peixe com as próprias mãos ganha uma forte dimensão simbólica. Ou seja, a captura do peixe representa a fascinação que o homem mais velho exerce sobre a menina, talvez uma armadilha construída pelo primeiro para possuí-la.
Andrea Arnold, responsável também pelo ótimo roteiro, opta por utilizar a "câmera no ombro" para mostrar a realidade de Mia, numa linguagem próxima do documentário. O filme é quase todo construído através de um ponto de vista semi-subjetivo. Arnold nos faz ter acesso ao olhar de Mia, que está em todas as cenas do longa. Ao forçar a identificação do espectador com sua protagonista, a diretora consegue fazer com que tenhamos uma profunda empatia com a personagem que é, a princípio, antipática. A instabilidade da câmera confere intensidade e "efeito de real" ao filme. Além disso, o roteiro é despudoradamente cruel e realista. Em determinado momento, Tyler, uma criança de nove anos, diz a Connor que cuidava de um corte no pé de Mia: "Cuidado com a AIDS!". Esse tipo de brincadeira revela o quanto a educação dessa criança foi contaminada pela maldade do mundo adulto. Outra cena chocante é aquela em que Mia joga uma criança de 5 anos num rio. A própria cena de pedofilia (porque, afinal de contas, é isso o que ocorre) se torna grotesca quando reanalisamos o filme ao final.
O filme é imensamente favorecido pela performance de Katie Jarvis. A garota tinha menos de 18 anos quando fez o filme. Ela foi descoberta na rua enquanto tinha uma discussão acalorada com o namorado. Na época, ela tinha largado a escola e estava desempregada. O uso de uma atriz não profissional talvez tenha sido uma escolha genial de Arnold. Podemos nos perguntar o que de Mia, Katie Jarvis tem? Ou o que de sua vida, de seus problemas ela emprestou à personagem? Fato é que, no mesmo ano em que o filme foi lançado, ela deu a luz a uma menina e, desde então, não fez mais cinema. Confesso que tenho curiosidade de saber o que aconteceu com a atriz. No entanto, de qualquer forma, a atuação de Jarvis é impressionante, sensível, visceral. As performances de Kierston Wareing e da pequena Rebecca Griffiths são também excelentes. Provavelmente, a mais bela cena do filme é aquela em que a mãe e as duas filhas dançam juntas. Um momento único de comunicação entre as três personagens, e na cena as três atrizes brilham. O sempre interessante Michael Fassbender interpreta um personagem ambíguo e sedutor. Seria ele um lobo na pele de cordeiro? Existe alguma boa intenção em suas ações? Aos poucos seu caráter duvidoso vai se revelando ao espectador.
Fish Tank é um filme assustadoramente bonito, violento e triste. Vale a pena conferir!
Curti mais seu texto do que o próprio filme, acho que preciso rever. Mas como você falou, algumas cenas foram bem bonitas de se ver, a mãe dançando com as filhas foi uma delas.
ResponderExcluirGostei muito desse filme também.
ResponderExcluirTraz um novo ar para o cinema independente britânico, com uma atriz inexperiente e um tema totalmente polêmico.
Também vale destacar as grandes atuações de todo o elenco, que mandaram muito bem!
Leonardo, parabéns pela entrevista no POSES E NEUROSES. Gostei muito. Desde já, linkarei o seu blog.
ResponderExcluirCumprimentos cinéfilos!
O Falcão Maltês