Título original: A dangerous method
Lançamento: 2011
País: EUA
Diretor: David Cronenberg
Atores: Michael Fassbender, Keira Knightley, Viggo Mortensen e Vincent Cassel
Duração: 99 min
Gênero: Drama
Gênero: Drama
Michael Fassbender e Viggo Mortensen interpretam Jung e Freud, respectivamente. |
David Cronenberg é indubitavelmente um dos cineastas mais instigantes da atualidade. Muitos dos seus filmes mais conhecidos são associados a um gênero em particular, a ficção científica, como o jovem clássico A Mosca (1986) e os cults Scanners (1981) e eXistenZ (1999). O diretor canadense conseguiu, no entanto, expandir sua obra para outros gêneros como, por exemplo, o drama, com Spider (2002), e o thriller, com Marcas da Violência (2005), sem, no entanto, deixar de lado seu interesse pelo caos, pela dimensão psicanalítica de seus personagens e por narrativas audaciosas e perturbadoras. Cronenberg é, provavelmente, o cineasta mais kafkaniano de que temos notícia. Não chega a surpreender o interesse do diretor em realizar um filme sobre dois dos maiores ícones da psicanálise: Sigmund Freud, o fundador do método, e Carl Jung, um discípulo contestador. Um Método Perigoso (2011), o filme em questão, foi roteirizado pelo roteirista/dramaturgo Christopher Hampton, de Ligações Perigosas (1988) e Desejo e Reparação (2007). O filme é a adaptação da peça The Talking Cure (também de Hampton), que, por sua vez, é baseada no livro A Most Dangerous Method do escritor americano John Kerr.
Um Método Perigoso retrata dois encontros extremamente importantes no mundo da psicanálise. O primeiro deles é aquele entre Jung e sua célebre paciente, Sabina Spielrein, que viria a se tornar, posteriormente, uma das primeiras psicanalistas mulheres da história. Hampton e Cronenberg acertadamente optaram por focalizar não apenas a relação amorosa do casal, mas também a fecunda e intensa relação intelectual que se estabeleceu entre os dois, assim como a influência que o pensamento de um teve sobre trabalho do outro. A outra relação abordada pelo filme não é menos interessante. Um Método Perigoso pinta o nascimento da amizade entre Freud e Jung, o gradual distanciamento dos dois e a ruptura final. Não é difícil perceber que o filme reforça a imagem paternal de Freud com a relação a Jung e a necessidade deste de sair da sombra do grande mestre.
O filme se estrutura em duas partes facilmente identificáveis. Na primeira metade do longa-metragem, temos um destaque maior para a relação Sabina x Jung. Na segunda, a trama se concentra na relação Jung x Freud. Jung é, portanto, a figura central do filme, ao redor da qual pivotam os outros personagens, inclusive o interessante Dr. Otto Gross. O ponto de vista do protagonista é aquele que predomina no filme e poderíamos conceber outras narrativas sob a perspectiva de Freud e Sabina. Uma das maiores qualidades do roteiro de Hampton é o de fazer com que todas as teorias em jogo, nas discussões intelectuais dos personagens, sejam facilmente digeridas pelo espectador leigo, o que faz do filme uma boa introdução ao estudo da psicanálise e da oposição entre a visão de Freud e de Jung. No entanto, se por um lado o ditatismo da abordagem de Hampton possibilita que a história seja acessível a todos, ela contribui para o que é, a meu ver, o maior pecadilho do filme: o excesso de racionalismo.
Há algo de extremamente racional e frio na narrativa de Um Método Perigoso. As ideias dos personagens parecem mais convincentes e interessantes que seus próprios sentimentos, fenômeno que acaba por criar um distanciamento entre o espectador e os protagonistas. Por exemplo, a relação entre Sabina e Jung e até mesmo a atração sexual entre dois personagens não soam verdadeiramente intensos ou viscerais. Trocando em miúdos, o filme parece ser calcado muito mais no aspecto racional de seus personagens e falha em dar a dimensão necessária à vida emocional deles. A performance dos atores talvez contribua para essa lacuna emocional. O sempre interessante Michael Fassbender compõe um personagem que se destaca pela sua rigidez corpórea. Por mais que esteja torturado por diversos conflitos, o ator mantém a compostura de um intelectual burguês bem nascido e educado.
Já a performance de Keira Knightley talvez represente um dos pontos mais fracos do filme. A atriz se esforça, no início da trama, para dar corpo e voz a uma personagem histérica, mas, infelizmente, a construção da sua performance fica nítida, nos mostrando uma atuação muito estudada e artificial. O maior desafio ao se interpretar personagens desequilibrados ou loucos é o de fugir da simples caricatura e do exagero e fazer algo orgânico e verossímil. Infelizmente, Knightley acabou revelando suas limitações como atriz, nos mostrando, ao mesmo tempo, uma entrega e um esforço admiráveis. Outro problema é que a personagem se metamorfoseia ao longo do filme, perdendo, quase de uma hora para outra, o seu tom histérico. Mais bem sucedido são Viggo Mortensen e Vicent Cassel. O primeiro faz de Freud uma figura extremamente interessante e sedutora. O segundo tem uma pequena participação, onde rouba a cena, dando um verdadeiro show. Seu personagem, um "anjo do mal", talvez se destaque justamente por trazer um pouco de subversão à trama.
Em Um Método Perigoso, Cronenberg se reinventa, investindo em um gênero que não é comum em sua filmografia: a cinebiografia. O diretor aposta bastante nos closes, optando pela alternância ritmada de planos sobre os rostos dos personagens. Como o filme é basicamente baseado em conversações, a ferramenta do campo contracampo introduz dinamismo e, por vezes, tensão às discussões. Outra escolha do diretor é a de mostrar, em diversos momentos, dois personagens, um no primeiro plano e outro no segundo, com grande profundidade de campo (ambos nítidos). Tal procedimento permite unir dois personagens no mesmo quadro, criando uma impressão proximidade entre eles. Este recurso é utilizado sobretudo com Sabine e Jung, nas sessões de terapia. É interessante observar que, na cena final do filme, os personagens já não são mostrados dessa forma, evidenciando o rompimento definitivo entre eles. O diretor ainda mostra, de maneira extremamente sutil, as diversas inversões de papéis entre os personagens que ocorrem no filme, de analista a analisado. O filme ainda conta com uma bela fotografia que explora os tons pastéis e claros. É pertinente apontar como o universo de Freud é escuro, enquanto o de Jung é iluminado. Cronenberg não deixa de explorar as diferenças entre os dois personagens: classe social, cultura, raça, background, ideologia, etc.
Em Um Método Perigoso, David Cronenberg mais uma vez demonstra um grande fascínio pelo ser humano e pelo seu universo interior, dando especial atenção às neuroses de seus personagens. O caráter racional e frio do longa-metragem é algo intencional, uma abordagem que talvez faça do filme uma experiência menos envolvente. Embora seja um filme menor de Cronenberg e, mesmo que falte ingredientes para que seja excepcional, Um Método Perigoso representa um cinema de qualidade, com a assinatura de um cineasta sempre relevante.
Assista ao trailer:
Fui com muita expectativa ver o filme, e fiquei meio decepcionado... mesmo assim é interessante.
ResponderExcluirEssa Keira Knightley não me desce... nunca me convence.
ResponderExcluirEu gosto da Keira e acho q ela fez um bom trabalho no filme. O personagem é mto difícil... Claro q uma atriz mais gabaritada faria melhor... mas gostei dela.
ResponderExcluirSou suspeito em dizer que gostei desse filme. Aprecio tudo o que Cronenberg faz. A única falha do filme chama-se Keira Knightley.
ResponderExcluirO Falcão Maltês
Sinto que o filme funcionou muito melhor pra quem é da área de psiquiatria/psicanálise.
ResponderExcluirÉ um filme bem-feito, tecnicamente falando. Ótimas atuações de Viggo Mortensen e Michael Fassbender como Freud e Jung. É uma história muito estreita e, portanto, pouco atraente.
ResponderExcluirNão espere que Cronenberg vá fazer qualquer coisa para conquistá-lo com esse seu novo trabalho. Fica a impressão de estar vendo um bom filme mais nada que impressione.
Ótima crítica. Gostei bastante do filme, principalmente da técnica. As atuações foram muito boas e ao contrário de muitas pessoas eu gosto da Keira. Lembro que na época o filme estava passando em poucos lugares e apenas consegui assistir na Reseva Cultural (http://www.locamob.com.br/reserva-cultural-de-cinema/details) numa sala bem cheia.
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