sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Clássicos da Cinemateca - Cinco vezes Hitchcock


O dia 29 de abril é marcado pelo aniversário da morte do gênio Alfred Hitchcock. Na edição desta semana da coluna, homenageamos o diretor, falando sobre cinco obras importantes de sua filmografia.
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Alfred Hitchcock (1899-1980)
Pacto Sinistro (1951)
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Pacto Sinistro é um dos filmes mais interessantes de Alfred Hitchcock, ainda que não seja tão conhecido do grande público. O longa-metragem concentra algumas das cenas mais espetaculares da filmografia do diretor inglês, com destaque para as duas célebres sequências que se passam em um parque de diversões. Neste magnífico thriller psicológico, Hitchcock explora brilhantemente o jogo de luz e sombras e o clima de tensão e perversidade, o que nos remete ao gênero noir. O humor característico de Hitchcock continua presente, mas, desta vez, um humor negro, ainda mais ácido do que o de costume.
O filme é centrado em um encontro inusitado e macabro. Certo dia, um promissor jogador de tênis cruza com um sujeito bem peculiar numa viagem de trem. Tal encontro mudará a vida de ambos. Guy Haines, o jovem tenista, é casado com uma mulher interesseira e adúltera. Bruno Antony, o desconhecido, é um bon vivant que tem um pai dominador e rígido. Após uma conversa, Antony propõe um plano de assassinato cruzado: ele mataria a mulher do tenista e este mataria o seu pai. Assim, eles eliminariam os dois incômodos de suas vidas, sem despertar suspeitas. Um plano perfeito? Guy Haines não leva a sério a proposta, mas Bruno não desiste da ideia de executar o plano.
Haines é o perfeito modelo do bom moço. O protagonista joga de acordo com as regras, é bonito, ambicioso e vive um momento de ascensão social. Nada lhe foi dado de graça e ele teve que conquistar tudo em sua vida. Já Bruno tem características opostas. O antagonista nasceu em berço de ouro, não aceita regras, confronta a autoridade do pai, não tem talento, nem ambições particulares e não quer nada da vida, além de realizar suas pulsões imediatas. Em outra interpretação, podemos dizer que Bruno representa os impulsos obscuros de Haines, aqueles que são reprimidos para se viver em sociedade.
Se Guy Haines é interpretado pelo apenas correto Farley Granger, Bruno Anthony é vivido de maneira magistral por Robert Walker, que faz de seu personagem uma das figuras mais interessantes e sedutoras da filmografia de Hitchcock. O ator, que tinha problemas emocionais e problemas com bebidas, teve no filme de Hitchcock o maior trabalho de sua carreita. Infelizmente, o cinema foi privado prematuramente do talento de Walker, que morreu pouco tempo depois do lançamento do filme. No entanto, ele está imortalizado como um dos melhores vilões hitchcockianos. É interessante acrescentar que Hitchcock inclui no filme um ingrediente homoafetivo entre os dois personagens principais.
5 curiosidades sobre Pacto Sinistro:
Em Pacto Sinistro, Robert Walker oferece a performance mais impactante de sua carreira. A Premiere Magazine citou o trabalho de Walker em sua lista das 100 Maiores Atuações de Todos os Tempos.
Pacto Sinistro foi o penúltimo filme de Robert Walker. Ele morreu pouco tempo depois do lançamento do filme, em 1951, aos 32 anos, devido a uma reação alérgica a um medicamento.
- Patricia Hitchcock, filha do diretor, interpreta Barbara Morton no filme. Este é o terceiro filme da atriz.
- Hitchcock afirmou que a cena do carrossel contém o trabalho de dublê mais perigoso que dirigiu. Ele acrescentou que nunca mais autorizaria um dublê a correr aquele tipo de risco.
- Numa primeira versão do roteiro, o personagem de Robert Walker terminaria internado em um manicômio.
Janela Indiscreta (1954)
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Janela Indiscreta é um dos filmes mais queridos e célebres de Alfred Hitchcock. Esse irresistível suspense de 1954 reúne duas das maiores estrelas do cinema hitchcockiano: James Stewart e Grace Kelly. O ator interpreta um repórter/fotógrafo investigativo que quebrou a perna em uma de suas missões e se vê obrigado a ficar de repouso em seu pequeno apartamento. Entediado, o moço se distrai ao acompanhar, na sua janela, a vida de seus vizinhos. Grace Kelly é Lisa, a bela e elegante namorada do protagonista, uma mulher refinada que frequenta a elite novaiorquina e pensa em casamento. Se, a princípio, os namorados parecem ter estilos de vida incompatíveis, Lisa acaba por provar, que assim como o namorado, tem gosto pela aventura e, assim, o conquista definitivamente.
O Jeff de James Stewart é, assim como nós, um espectador e as janelas são como telas de cinema ou canais de televisão. Motivado por sua curiosidade de réporter, o personagem vai constatando o perfil de cada morador, muitos deles baseados em estereótipos: a bailarina sexy, a solteirona, os recém-casados, o pianista boêmio, o casal excêntrico, entre outros. Certa noite, ele observa alguns acontecimentos estranhos em um apartamento em frente, chegando à conclusão de que um homem matou sua esposa. Stewart encarna a figura do voyeur, mas Hitchcock faz com que o espectador também o seja. Ele dirige nosso olhar, nos instiga e, no decorrer do filme, também sentimos que estamos vendo o que não deveríamos, invadindo a privacidade daqueles personagens, fascinados por eles.
5 curiosidades sobre Janela Indiscreta: 
- O filme é inspirado, em parte, em um famoso e verídico caso de assassinato, seguido de esquartejamento, que teria ocorrido na Inglaterra, em 1924.
Janela Indiscreta foi todo filmado em um único set.
- Todos os sons presentes no filme são diegéticos, ou seja, fazem parte do universo ficcional da história, com exceção da música orquestral da abertura composta por Franz Waxman.
Janela Indiscreta foi eleito o 48° melhor filme de todos os tempos pelo American Film Institute e o terceiro melhor filme de mistério pela mesma instituição.
- As filmagens foram rápidas e ocoreram entre 27 de novembro de 1953 e 26 de fevereiro de 1954.
Psicose (1960)
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Psicose, filme de 1960, uma das quatro obras-primas mais conhecidas de Hitchcock, é um clássico do terror/suspense que permanece tão perturbador quanto na época de seu lançamento. O terror do filme advém sobretudo da maestria com que Hitchcock manipula o espectador, a seu bel-prazer, nos deixando a par do que ocorre em um sinistro hotel de beira de estrada, mas nunca nos revelando tudo de uma só vez. 
O filme nos apresenta falsas pistas com relação ao centro de sua intriga. Logo na primeira cena do longa-metragem, a câmera invade um quarto de motel, onde dois amantes aproveitam uma hora furtiva durante o dia. O filme, no entanto, não conta uma história de amor. Depois, a mesma moça do motel rouba uma grande soma de dinheiro do escritório em que trabalha. Tampouco a trama do roubo é o centro do filme. E, por fim, é no mínimo inusitado e surpreendente que a protagonista seja assassinada na metade do filme.
Um dos golpes de gênio de Hitchcock é a maneira com que ele nos despista, para nos apresentar, quase na metade da projeção, uma trama macabra, representada pelo fantástico personagem Norman Bates e o seu hotel no meio do nada. Bates, um dos personagens mais aterrorizantes do cinema, foi imortalizado por Anthony Perkins. É brilhante a forma com que Perkins compõe seu personagem: a princípio, um jovem naturalmente simpático e tímido, que gradualmente vai revelando o seu desequilíbrio. 
A cena mais célebre do longa-metragem é tão famosa, que muitas pessoas a conhecem sem nunca terem visto o filme. Não por acaso ela se tornou um marco na história do cinema e é considerada, até hoje, uma das cenas mais assustadoras de todos os tempos. A sequência é construída através de uma sucessão de cortes rápidos ritmados pela trilha sonora e pelo som da faca. E se observarmos atentamente, vemos que, em nenhum momento, a arma sequer encosta na atriz. A violência está na genial montagem de Hitchcock e na trilha sonora de arrepiar de Bernard Herrmann.
5 curiosidades sobre Psicose: 
- Último filme de Hitchcock em preto e branco.
- O filme foi votado como o sétimo mais assustador de todos os tempos pela revista Entertainment Weekly e ocupa o 14° lugar na eleição de 2007 dos 100 melhores filmes de todos os tempos do American Film Institute.
- A frase "A boy's best friend is his mother" ocupa o 56° lugar na lista de melhores frases do cinema pelo American Film Institute.
- O designer gráfico Saul Bass fez o storyboard da famosa sequência do chuveiro. Existem rumores de que ele também tenha dirigido a cena.
- A cena do chuveiro foi filmada em sete dias, usando 70 ângulos de câmera diferentes. Ela dura 45 segundos.
Os Pássaros (1963)
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Os Pássaros, lançado em 1963, é o último grande clássico de Alfred Hitchcock e um dos filmes mais espetaculares do diretor. A trama do filme é relativamente simples: uma cidade do litoral americano, Bodega Bay, próxima a San Francisco, é o alvo de ataques de aves das mais diversas espécies. Junto a Psicose, este é o filme de Hitchcock que mais se aproxima do terror. Como é de costume em muitas de suas obras, uma mulher (normalmente uma loira platinada) é a responsável pela chegada do "mal" à vida dos outros personagens. Desta vez, quem ocupa esse papel é a atriz Tippi Hedren. A chegada da personagem à cidade é motivada por um namorado em potencial. Logo após, os ataques se iniciam.
Os Pássaros não conta com trilha sonora ou música de nenhum tipo. Os sons das aves e o canto das crianças são utilizados como amplificadores da tensão. A filmagem dos ataques dos pássaros foi extremamente difícil e demandou um trabalho intenso de criação da equipe de efeitos especiais com os recursos disponíveis na época. Tais sequências impressionam até hoje. Uma das últimas cenas do filme, a cena de ataque à personagem de Hedren, foi filmada em uma semana, ao final da qual a atriz teve que ser levada para o hospital para recuperar-se da exaustão.
O brilhantismo do filme consiste justamente na maneira como Hitchcock conseguiu aliar invencionismo e criatividade, para realizar um dos maiores filmes-catástrofes do cinema.
5 curiosidades sobre Os Pássaros: 
- Mesmo não apresentando trilha sonora, o filme contou com a consultoria de Bernard Hermann. De acordo com o compositor Norman Lloyd, foi o próprio Hermann quem aconselhou o não uso de música.
- O filme é baseado num conto de Dauphine Du Maurier, que também escreveu o romance que deu origem a Rebecca, a Mulher Inesquecível (1940), outro clássico de Hitchcock.
- A atriz Tippi Hedren foi descoberta por Hitchcock em um comercial para uma bebida diet em que um homem assovia para ela na rua. A cena de abertura, em que a atriz vai em direção a uma loja de pássaros, é inspirada na propaganda.
- Melanie (Tippi Hedren) utiliza a mesma roupa durante todo o filme. Na verdade, foram feitas seis peças idênticas.
- Foram usadas aves treinadas, aves mecânicas e marionetes.
Marnie – Confissão de uma Ladra (1964)
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Muitos torcem o nariz para Marnie - Confissão de uma Ladra, filme de 1964 de Alfred Hitchcock. Marnie faz parte da fase final da carreira do diretor e não teve um grande orçamento como Os Pássaros, por exemplo. Hitchcock ainda teve diversas dificuldades na realização do filme, inclusive na escolha de seu elenco. O diretor queria Rock Hudson e ganhou Sean Connery para o papel principal. Tippi Hedren também não era a primeira opção.
Marnie é um filme que tem pouco do humor e da irreverência característicos de Hitchcock. A sinopse poderia nos remeter a um filme irreverente e leve como Ladrão de Casaca (1955), observe: uma ladra em série é o alvo da paixão da sua última vítima. Mas o filme é um drama psicológico pertubador e incômodo. Marnie é um dos filmes mais “freudianos” do diretor. Desejo e repulsa ao sexo permeiam a narrativa.
Tippi Hedren dá vida a uma ladra de vários nomes, atormentada por um grande trauma de infância, algo mal resolvido que não permite que ela tenha uma vida normal. O esforço da atriz chega a ser comovente no papel: a personagem é interessante e Hedren dá o máximo que o seu modesto talento permite. Sean Connery, o par romântico da atriz, havia feito a sua estreia como James Bond dois anos antes de estrelar o filme de Hitchcock.
Mesmo que o aspecto psicanalítico seja extremamente importante no filme, a analogia ao mundo animal parece ser ainda mais preponderante. Os personagens de Connery e Hedren são asociados, respectivamente, ao predador e à presa. Uma determinada cena de “estupro” continua a impactar ainda hoje.
Mesmo que não seja um dos filmes mais exemplares do diretor inglês, Marnie é um filme sombrio que combina supense, drama psicológico e melodrama.
5 curiosidades sobre Marnie – Confissão de uma Ladra:
- Inicialmente, o filme seria estrelado por Grace Kelly. O diretor queria que a atriz fizesse seu retorno às telonas neste filme, mas a opinião pública em Mônaco não se mostrou favorável em ver a princesa interpretar uma ladra compulsiva.
- Esta foi a última parceria de Hitchcock com o compositor Bernard Hermann.
- Existem rumores de que Hitchcock e Tippi Hedren tiveram um grande deentendimento durante as filmagens e que, a partir de então, ele passou a dirigi-la através de intermediários.
- Hedren afirmou que Marnie é o seu filme favorito, dentre aqueles nos quais atuou.
- Depois da desistência de Grace Kelly, Hitchcock considerou cerca de seis atrizes antes de dar o papel da protagonista para Hedren.


Leia também a matéria especial sobre Um Corpo Que Cai (1958).

TEXTO DE MINHA AUTORIA PUBLICADO ORIGINALMENTE NA COLUNA CINEMATECA, DO SITE CINEMA EM CENA. 

4 comentários:

  1. Ainda estou devendo Janela Indiscreta, e que me perdoem, mas não acho Psicose grande coisa. Festim Diabólico e Os Pássaros são meus favoritos do Tio Hitch.

    http://avozdocinefilo.blogspot.com.br/

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  2. Ótimo Post, concordo plenamente com Pacto Sinistro e Psicose mas os outros eu substituiria por UM CORPO QUE CAI E INTRIGA INTERNACIONAL que ao meu ver são o "Ápice dos últimos Bons Filmes de Hitch".
    Grande Abraço, e apareça em meu blog ok!!!

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    1. Olá Jefferson,
      Não se trata de uma eleição dos melhores filmes de Hitchcock.
      Parabéns pelo seu blog! Abração.

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  3. Tippy não era uma boa atriz. Se saiu melhor como sogra de Antonio Banderas. Melanie, sua filha, mulher de Banderas, recebeu esse nome por causa do personagem de Tippy em Os pássaros.

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